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Saneamento: o Rio de Janeiro decola e a Bahia deve pegar carona

Mauricio Dantas Bezerra e Guilherme Teixeira Pereira

Em 14 de novembro de 2009, a festejada revista britânica The Economist publicou uma icônica capa com o cristo redentor decolando como um foguete, exclamando: Brazil Takes Off ou o Brasil decola. A capa da revista representava a percepção do mundo em relação ao país naquele momento. Passados quase 12 anos desde a publicação, o Brasil frustrou as expectativas de todos e infelizmente regrediu em uma série de índices socioeconômicos que à época pareciam que ficariam no passado. O dia 30 de abril de 2021 poderá ser lembrado pelos cariocas como mais uma chance de o Rio de Janeiro decolar, pelo menos em relação ao setor de saneamento. Neste dia, o estado do Rio de Janeiro concluiu com enorme sucesso (apesar da frustração em um dos lotes) a licitação para a concessão dos serviços de abastecimento de água e tratamento de esgoto em 29 municípios, dentre eles a capital do Estado. Até então os serviços eram prestados pela Companhia Estadual de Águas e Esgoto do Rio de Janeiro – Cedae. O Rio de Janeiro tomou a decisão de seguir o direcionamento do Novo Marco Legal do Saneamento (Lei 14.026/2020) e conceder os serviços à iniciativa privada. Essa opção permitirá que o Estado atraia e aloque investimentos de forma eficiente no setor, em prol do cumprimento das metas estabelecidas no Novo Marco Legal de universalização, que garantam o atendimento de 99% da população com água potável e 90% com coleta e tratamento de esgoto até 2033. No caso do Rio de Janeiro as novas concessões beneficiarão diretamente mais de 11 milhões de cidadãos cariocas, o que corresponde a cerca de 70% da população total do estado. A obrigação assumida pelas novas concessionárias é que até 2033 o serviço de abastecimento regular de água amplie-se de 87% para 99% da população atendida por essas concessões. Já em relação ao tratamento de esgoto que, atualmente, é disponibilizado apenas a 68% da população nas respectivas áreas concedidas, deverá atingir 90% da população na mesma data. A previsão é de que as novas concessionárias realizarão investimentos que somam cerca de R$ 30 bilhões no prazo das concessões (35 anos), sendo certo que parte relevante será concretizada nos primeiros 12 anos, segundos os dados publicados. Outro aspecto relevante para o sucesso da concessão promovida pelo Estado do Rio de Janeiro está na maneira inteligente como foi estruturada a “regionalização” dos serviços, mecanismo incentivado pelo novo Marco Legal do Saneamento de maneira a viabilizar os investimentos em áreas com menos ou sem viabilidade econômica. Lá no Rio de Janeiro, a capital fluminense foi dividida em áreas de atuação que foram conjugadas com outros municípios, e assim foram licitados quatro lotes.

A Bahia deve olhar com atenção para o que aconteceu no Rio de Janeiro. Estudos realizados pela KPMG a pedido da ABCON – Associação Brasileira das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto indicam que 82% da população baiana é atendido com o abastecimento de água e apenas 39% dos baianos contam com os serviços de tratamento de esgoto. Segundo o mesmo estudo, a Bahia demandará cerca de R$ 30 bilhões de investimento para cumprir com as metas de universalização até 2033, recursos que o Estado e a Empresa Baiana de Água e Esgoto – Embasa não contam, e podem ser alocados pelo Estado em outros serviços essenciais. Não se pode desconsiderar as particularidades sociais e geográficas na Bahia, mas urge que o Estado apresente uma solução que atenda aos interesses dos baianos. A Região Metropolitana de Salvador representa parte significativa da totalidade da receita dos serviços de saneamento no Estado da Bahia. Para se ter uma ideia, somente Salvador é responsável por cerca de 45% da receita operacional da Embasa. Esse percentual deixa clara a importância de uma participação ativa do Município de Salvador na construção de uma solução, município em que a Embasa, por incrível que pareça, presta o serviço sem a existência de um contrato de concessão ou de programa há décadas. O desafio agora é estruturar um desenho institucional que assegure viabilidade técnica, jurídica, e econômica e financeira, capaz de atrair os investimentos necessários para se atingir as metas de universalização dos serviços de saneamento no Estado da Bahia. Nesse contexto, a Bahia deve seguir o exemplo fluminense e pegar carona no foguete carioca, inclusive aprendendo com os percalços enfrentado se reduzir ou até mesmo eliminar a judicialização do processo, mitigando, assim, as zonas de conflito e aumentando a atratividade para o setor privado, o que deve gerar pagamentos ainda mais expressivos de outorgas. O leilão coordenado pelo Estado do Rio de Janeiro levantou R$ 22,6 bilhões em outorgas fixas, o que representou um ágio médio de 113%.O valor obtido será dividido entre o Estado, 29 Municípios pertencentes à região concedida e o Fundo Metropolitano, que poderão utilizar esses recursos na prestação de outros serviços essenciais (e mesmo de saneamento em municípios fora do âmbito da concessão) ou reduzir o seu endividamento. Além da injeção imediata de capital na economia do Estado e Municípios, a concessão ainda promoverá uma série de benefícios indiretos, tais como a redução de custos e despesas com saúde, aumento da produtividade e remuneração do trabalhador, valorização imobiliária, renda gerada pelos investimentos, maior arrecadação de impostos e maior renda com turismo advindo de melhores condições ambientais. O Rio de Janeiro decola no setor de saneamento e a Bahia deve pegar carona. Que bom seria ver a imagem do farol de Itapuã decolando como um foguete.

*Mauricio Dantas Bezerra, advogado, mestre em Direito Econômico pela Universidade de Warwick Reino Unido e membro da Comissão de Concessões e PPPs da OAB/BA e Guilherme Teixeira Pereira, advogado, mestre em Direito do Negócios e Desenvolvimento Econômico Social pela FGV/SP; pesquisador visitante na Universidade de Columbia em Nova York, Presidente da Comissão de Concessões e PPPs da OAB/BA.

Fonte: A Tarde.

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